sexta-feira, 11 de março de 2011

em quê se tornaram as discussões sobre música no brasil?




Numa caça às bruxas! Nisto se tornaram as discussões sobre música no Brasil, quiçá no mundo inteiro. Seria ingênuo de minha parte pedir que cada brasileiro iniciasse seu desarmamento intelectual pela língua, que falasse sobre música com menos acidez e mais desapego estilístico. Mas se até a paz é algo que em milênios a humanidade não foi capaz de aprender, minhas perspectivas partem para o desânimo.

Antes de prosseguir, ouça um trecho da entrevista de ontem do cantor e compositor Lobão ao programa Pânico, da Rádio Jovem Pan.



O mesmo sujeito que recebera uma vaia histórica, com direito a garrafadas e outras sutilezas, na segunda edição do Rock in Rio (1991), quando se achava a própria incorporação do rock nacional, destila suas críticas ao som da molecada de hoje em dia.

Lobão é um cidadão livre e tem direito à opinião própria. Muito do que ele disse reflete também a minha opinião e até meus últimos dias, se o atual estado de coisas permanecer, não negarei. Sua atitude em cadeia nacional, todavia, não deixa de lembrar aquelas subcelebridades loucas por estamparem as revistas de fofoca e observação da vida alheia que não chegam a dois reais o exemplar.

E se observar a vida alheia é algo deplorável, usar do sucesso alheio como válvula de escape é pior ainda. Lobão teve mais sucesso que os artistas de sua época pelas declarações polêmicas e marketing pessoal muito bem realizado. Que me perdoem seus fãs, mas eu sempre fui adepto da política do “para criticar, proponha ou faça algo melhor” e não conheço sequer um trabalho genial lançado por este indivíduo nos últimos tempos.

Dinho Ouro Preto, num programa comandado pelo próprio Lobão e seguindo a linha do mestre, alegara que Restart faz a banda Fresno parecer Dostoievski. OK, também acho as duas bandas carentes de ideologia e tudo o mais, o velho papo que todo mundo já conhece. Fica uma pergunta bem pessoal: quem é Dinho Ouro Preto? A mim ele também faz Bruce Dickinson parecer Franz Kafka.

Ofender os grupos e artistas de grande apelo popular virou a fórmula certeira para resgatar uma porção de fãs que partilham da mesma raiva e, de quebra, adquirir um status cult e contrário ao sistema e às instituições. E ainda dá mostras de bom funcionamento a velha tática de justificar sua escassez de ideias e trabalhos bons às custas de alguém não tão diferente de você, senão por cair nos braços do povo, vender mais e melhor que você.

Os dois artistas supracitados e tantos outros, vividos e politizados, provam que a discussão séria sobre música no Brasil acabou. Raramente vejo uma roda de jovens falando de técnica, estética, ideologia, inovação, revolução, as múltiplas e deliciosas faces que a música pode assumir na sua condição fundamental de arte.

Aqui não critico a legitimidade da liberdade de expressão, do humor negro e da opinião forte; apenas reflito na tendência abutre de saudar os antigos companheiros de espécie em voo livre, vivendo às custas da carne e sangue frescos dos cadáveres jovens. A cultura nacional fica estagnada e ninguém ganha com isso.