quinta-feira, 31 de março de 2011

o caso bolsonaro




Milhões de televisores exibiram em rede nacional o mais recente deboche à Constituição efetuado pelo deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). Nem mesmo o formato pergunta-resposta do quadro em questão foi capaz de intimidar o político que, em sentenças curtas e cientes de si, incorreu publicamente nos crimes de incitação à violência, racismo e homofobia, por mais que este item não tenha formatação adequada na legislatura penal brasileira em pleno século XXI.

Cantarei uma bola que você, caro leitor, há de me cobrar nas próximas eleições federativas: Bolsonaro será reeleito com maior expressividade de votos.

Em outras palavras, se por um lado sua entrevista gerou a manifestação contrária de tantos, também foi capaz de expor o espírito retrógrado que ainda reside no brasileiro típico, seu preconceito velado e o descaso com que deposita seu voto. Não sou ingênuo a ponto de considerar este um país sério e com níveis de educação satisfatórios para que tal declaração cave sozinha a sepultura de um homem público.

Bolsonaro presta um serviço curioso à nação: privar seus cidadãos de si mesmos, negando toda a pluralidade cultural que, sob uma ótica mais inteligente e inclusiva, pode ser considerada uma das maiores bênçãos de nossa formação histórica. É por isso que seus partidários ainda serão nossos congressistas por gerações, ironicamente os porta-vozes de nossos mais profundos anseios por uma sociedade justa e igualitária.

A simples manifestação afetiva entre homossexuais na via pública é, para muitos, ato ilícito, imoral, descabido, apologia à promiscuidade, digno de tapar os olhos de seus filhos. Os mesmos filhos que, ainda pequenos, almoçam em frente à tevê, durante o noticiário de milhares de mortes de um conflito qualquer no Oriente Médio, sem a menor necessidade de vendar as vistas. Não deixa de ser engraçado o filtro de conteúdo estabelecido por esse tipo de pais.

Não existe déficit social ou afronta de qualquer espécie nesse tipo de exposição. Ao contrário das bestialidades envolvendo crianças, animais ou cadáveres, a relação gay se estabelece entre dois seres adultos e conscientes de seus atos. São cidadãos livres e pagadores de impostos, verba esta que justifica inclusive o polpudo e nada merecido salário de Bolsonaro.

O nobre deputado sabe em que terreno pisa quando desmente as críticas sobre Preta Gil quanto à etnia, exaltando repúdio exclusivo ao seu comportamento sexual. Ele conhece muito bem a hipocrisia que predomina no julgamento de uma prática preconceituosa. Jamais ouse chamar um afrodescendente de “macaco”, mas sinta-se à vontade para, na mesma linha de comparativos com o reino animal, chamar um homossexual de “veado”. A lei equipara todo e qualquer tipo de discriminação, contudo, na prática, todos conhecem as implicações diferentes que ofensas tão semelhantes acarretam.

O simples temor pelo contato com o diferente explica o ranço ideológico das alas e mentes conservadoras. Uma falsa interpretação do princípio de liberdade de expressão dá a brecha para que digam o que bem entendem sem méritos punitivos – afinal de contas, para quê apresentar ao povo argumentos lógicos e sólidos, quando se é permitido legislar com base no gosto e na opinião?