sexta-feira, 15 de julho de 2011

capítulo 2: os reis do iê iê iê




O blues de Muddy Waters estava se tornando cada mais rápido entre os músicos americanos. Isso se deveu ao fato de que o delta do Mississippi, e em particular a cidade de New Orleans (que viria a se tornar um dos principais pólos culturais da América) estava sendo atingido em cheio pelo jazz advindo dos atuais estados do Alabama e da Geórgia, além da country music, vinda do wild west norte-americano, em particular do Texas e da Califórnia.

É interessante também atentar para o momento político dos EUA à época. O rock 'n roll traduziu-se como uma mistura de ritmos "negros" (como o blues) e a música "branca" (em particular o country), justamente em uma época em que a segregação racial estava tomando forma nos Estados Unidos. A música, muitas vezes, servia como protesto dos negros em questão, como Louis Jordan, um dos poucos negros dos primórdios do rockabilly/rock 'n roll que conseguiu fazer algum sucesso. Ainda assim, muitas das suas composições eram de músicos brancos, como seu sucesso Choo Choo Ch'Boongie. Por todo o conservadorismo da época, o rock 'n roll ainda não tinha engrenado, e um dos poucos que dava apoio ao ritmo nas rádios era o DJ Alan Freed, também conhecido como Moondog, que tocava na rádio WJW, em Cleveland, Ohio. Até que um certo branco, ex-caminhoneiro, mudaria toda a história, não só do rock 'n roll, mas do rock como um todo.
Elvis Aaron Presley (1935 - 1977)

Elvis Aaron Presley nasceu no estado americano do Mississippi. Sua família sempre foi muito pobre, o que se agravou ainda mais quando um tornado atingiu sua cidade, Tupelo, em 1936, quando Elvis tinha apenas alguns meses de vida. Assim cresceu o jovem Presley, até que, em 1945, aos 10 anos, Elvis leva o segundo lugar na Feira Mississippi-Alabama, o que lhe rendeu um prêmio de cinco dólares e ingressos para os brinquedos do parque. Apesar de ser relativamente pequeno, tal fato mudaria para sempre a história de Elvis, que ganhara um violão de seu pai naquele mesmo ano como presente. Elvis foi tomando gosto pela música, principalmente pelo country, pela música gospel e, eventualmente, obras eruditas, como as óperas que o tenor Mario Lanza, seu maior ídolo, cantava. Em 1953, tal aptidão musical o levou a gravar seus primeiros registros, ainda experimentais, em um estúdio da Sun Records. Em julho do ano seguinte, ele grava suas primeiras músicas profissionalmente, "That's all Right, Mama", de Arthur Crudup, e "Blue Moon of Kentucky". Na ocasião, ele conhece o guitarrista Scotty Moore e o baixista Bill Black, que seriam seus fiéis escudeiros nos anos subsequentes.

Apenas dois dias depois de gravadas, as músicas já faziam sucesso nas rádios locais. No dia 16 de outubro, Elvis teve um de seus shows transmitido por uma rádio local, que foi, de fato, o primeiro passo em direção ao seu sucesso. Vários shows, subsequentes a esse, eram transmitidos nas rádios e na televisão, aumentando ainda mais seu sucesso, em particular em razão das garotas, que o apelidaram de "Elvis the Pelvis" em razão de seu gingado. Dali para a primeira música Top 1 nacionalmente, "I Forgot To Remember To Forget", foi apenas questão de tempo. E mais que simplesmente um cara talentoso com um rebolado bacana, Elvis mexia também com o ego dos mais conservadores musicalmente, sabendo-se que ele foi um dos pioneiros da já descrita fusão de ritmos até então segregados. Isso aumentou ainda mais sua popularidade. Elvis também revelou-se um excelente ator: os filmes "Jailhouse Rock" e "King Creole" foram um absoluto sucesso. Àquela altura, a alcunha de Rei do Rock, que o acompanha até os dias de hoje, já era entoada em coro uníssono em seus shows.

Um fato alteraria totalmente sua vida e sua carreira: em 1960, Gladys Love Smith Presley, sua mãe, falecera, justamente no momento em que seu único filho alcançara o ápice em sua carreira musical e cinematográfica. Ainda assim, Elvis grava alguns de seus melhores discos na década de 1960, como Viva Las Vegas, trilha sonora do filme homônimo que é tido como um dos clássicos de sua carreira. Houve até um breve encontro com a mais nova febre na Inglaterra, os Beatles, em 1965. Infelizmente, nada foi gravado desta ocasião histórica. Em 1969, depois de 8 anos sem fazer turnês, Elvis decide retornar a elas justamente na Sin City, Las Vegas. Porém, ele deixara de lado a "inocência" de outrora e se tornara um perfeito showman, o que fez alguns fãs mais antigos deixarem, ou passar a gostar menos, seu ídolo. Isso, aliado a alguns problemas de ordem pessoal, fez com que Elvis se tornasse um homem extremamente excêntrico: nos últimos meses de vida, Elvis consumia cerca de 94 mil calorias por dia. Só o café da manhã dele incluía mais de 5 mil calorias: 6 ovos quentes com manteiga, ½ quilo de bacon, 250 gramas de linguiça e 12 biscoitos amanteigados. Aliado ao uso excessivo de drogas, a má alimentação fez com que Elvis sofresse uma parada cardíaca, o que resultou em sua morte, a 16 de agosto de 1977. Seu corpo, encontrado por sua então namorada Ginger Alden na masão Graceland, em Memphis, Tennesee, foi sepultado em Forest Hill. Por´me, uma tentativa de furto de seus restos mortais (algo semelhante ao que ocorrera a Charles Chaplin, anos antes) fez com que a família optasse por sepultá-lo em um dos jardins de Graceland.

Enquanto isso, na Inglaterra...

Aquele show de Muddy Waters na década de 1950, em Londres, foi histórico. Não só por ter sido a primeira vez que um blues man foi levado além da América, mas porque suas raízes seriam firmemente presas ao território europeu, o que desencadearia uma nova mania nos ares de uma Europa ainda presa a uma música trazida desde a Idade Média e pouco modificada no decorrer dos anos. Mas desde que Waters se apresentou na capital inglesa, os londrinos tiveram o privilégio de presenciar o nascimento de uma nova subvertente do blues, que posteriormente ficou conhecida como London blues.

O London blues (ou blues londrino, ou ainda blues britânico) tinha como características a fusão do blues elétrico trazido por Waters mais alguns elementos folk, com bastante presença na Europa à época. Essa mistura proporcionou uma das maiores febres musicais que a Inglaterra já havia visto. Bandas como Fletwood Mac e Rolling Stones, além de cantores e guitarristas (assim como no blues americano) como Bob Dylan e John Mayall, embalaram as noites dos fins de semana londrinos no Marquee Club, que se tornou o principal ponto de encontro musical da cidade. Merecem destaque significativo um blues man e uma banda que, embora não sejam de Londres, fizeram barulho na capital inglesa e foram, possivelmente, as maiores influências do rock que estava por vir nas décadas subsequentes.

Eric Patrick Clapton (1945 - )
O tal blues man, Eric Patrick Clapton, nasceu em Ripley, em 1945. Filho de mãe solteira aos 16 anos, Clapton foi criado por sua avó, acreditando que esta era sua mãe, e sua verdadeira mãe, sua irmã mais velha. Foi descobrir a verdade aos nove anos de idade, tendo sido este um fato marcante em sua vida - dizem que era um garoto que passava a maior parte do tempo calado e praticamente não tinha amigos. Clapton, que ganhou seu primeiro violão aos 13 anos, passa a se dedicar cada vez menos à escola e cada vez mais à música, que servia como um refúgio de sua conturbada vida. A princípio como um mero entusiasta dos músicos americanos, o jovem Clapton foi se tornando um autodidata no instrumento, até pegar gosto pela guitarra elétrica do pioneiro Muddy Waters. Em 1963, ele ingressa em sua primeira grande banda, o Yardbirds, da qual saira em março de 1965, já que a banda, segundo Clapton, estava se rendendo ao sucesso, em detrimento de sua sonoridade. Tal episódio fez com que Eric Clapton ganhasse a simpatia da juventude londrina, que pichava a cidade com a inscrição "Clapton is God" (Clapton é Deus), alcunha que ainda hoje é utilizada por alguns entusiastas de seu som blueseiro. Depois de uma rápida passagem pelo John Mayall & the Bluesbreakers, Clapton formou seu próprio grupo com a ajuda de seus amigos Jack Bruce e Ginger Baker, o Cream, certamente influência para milhares de bandas que viriam posteriormente.

Os Beatles, em 1964: John Lennon e Paul McCartney
(em cima) e George Harrison e Ringo Starr (embaixo)
Já a tal banda teve seu som calcado no skiffle e no rock 'n roll, que surgiam paralelamente nos EUA e eram baseados no blues daquele lado do Atlântico. Juntaram-se cinco jovens, John Winston Lennon, James Paul McCartney, George Harold Harrison, Stuart "Stu" Sutcliffe e Randolph Pete Best, para formar a banda mais famosa e aclamada de todos os tempos, os Beatles. Originários da cidade de Liverpool, o Fab Four (como ficaria conhecida a formação clássica, com Lennon na guitarra base, Harrison na guitarra solo, McCartney no baixo e Ringo Starr, que entraria no lugar de Best e após a morte de Sutcliff, na bateria, onde todos cantavam) é ainda hoje o grupo musical mais popular da história. Construíram sua reputação tocando em pequenos bares na sua cidade natal e na cidade alemã de Hamburgo, onde rapidamente alcançaram a notoriedade da (à época, nem tão) toda-poderosa do mercado fonográfico EMI. Gravaram todos os seus discos nos célebres estúdios Abbey Road, que ficariam imortalizados na capa dos mesmos Beatles, em seu disco homônimo ao estúdio. Certamente foram a maior banda de rock 'n roll da história, tendo, no entanto, não ficado presa ao estilo, experimentando, posteriormente, o folk rock de nomes como os já citados Eric Clapton e Bob Dylan.

Além da mistura do rock 'n roll com o folk, proposta pelos Beatles, surgira no meio underground da terra da rainha uma sonoridade única. Na cidade famosa por sua Universidade renomada por ganhar vários prêmios Nobel, Cambridge, cinco jovens sonhavam em criar sua própria banda. Mais que isso, eles criaram um estilo totalmente único, certamente base para diferentes vertentes que surgiriam décadas depois. A mais nova onda dos ares bretões era o psicodelismo, que posteriormente evoluiu para o estilo conhecido como progressivo, dos quais até os maiores rockstars da época, os Beatles, beberiam da fonte. Isso, no entanto, fica pro próximo capítulo...